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22 de julho de 2011

“Crentes” teóricos? Essa não!!!

o-perfil-de-um-fariseuÉ notório o grande crescimento dos interessados no estudo da teologia em nossos dias. Os seminários e faculdades teológicas têm se proliferado; na rede mundial de computadores, com uma rápida pesquisa, percebemos que o número de “debatedores” da doutrina é cada vez maior. São arminianos, calvinistas, liberais, dispensacionalistas, carismáticos, pentecostais, cada um defendendo o seu ponto de vista com veemência.

Em princípio, esse quadro deveria nos causar alegria, afinal de contas é muito bom ver pessoas interessadas nas Escrituras e debatendo sobre a Palavra. Mas uma pergunta tem de ser feita: os que têm discutido com tanta paixão têm experimentado um crescimento em santidade decorrente do conhecimento bíblico que professam?

Há um perigo muito grande em tornar a doutrina um fim em sim mesmo. Há na Palavra de Deus advertências sérias quanto a isso. Na epístola de Tiago a ordem é para que os crentes sejam praticantes da Palavra e não somente ouvintes, pois os que são simplesmente ouvintes enganam-se a si mesmos (Tg 1.22). Em seu ministério o Senhor Jesus repreendeu incontáveis vezes os escribas e fariseus, chamando-os de hipócritas, justamente por falarem e não fazerem. Ele chegou a ensinar a multidão, com respeito aos fariseus, da seguinte maneira: “Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém não os imiteis nas suas obras; porque dizem e não fazem (Mt 23.3).

Eis aí o retrato de um “crente” teórico. É aquele que tem a doutrina na ponta da língua, muitas vezes decora vários versículos bíblicos, é capaz de discorrer com propriedade sobre as doutrinas mais complexas, mas não a vive no seu dia-a-dia. Esse tipo de pessoa, como afirma Tiago, engana-se a si mesmo, pois, como bem afirma John Blanchard, “o crescimento cristão requer mais do que conhecimento da Bíblia; ninguém jamais se alimentou decorando cardápios”[1].

Há no Novo Testamento uma igreja que foi elogiada pelo Senhor Jesus pelo seu conhecimento doutrinário. O Senhor chega a afirmar que aqueles crentes colocaram à prova os falsos mestres que se declaravam apóstolos e os acharam mentirosos (Ap 2.2-4). Pelo visto, aqueles irmãos eram bastante preparados no que diz respeito ao conhecimento doutrinário, contudo, Jesus os repreende dizendo que haviam abandonado o primeiro amor.

Infelizmente, isso é mais comum do que se imagina. Mesmo dentro de nossas igrejas, temos membros que foram doutrinados desde a tenra idade, que frequentam regularmente os cultos, mas por mero costume. A doutrina não tem efeito prático em suas vidas e eles demonstram que, à semelhança dos crentes de Éfeso, deixaram o primeiro amor.

Devemos ter muito cuidado para não ser meramente religiosos e também para não cair na cilada de colocar o amor à doutrina à frente do amor ao Senhor, pois fazer isso é incorrer na quebra do primeiro mandamento (Êx 20.3).

É claro que só se pode amar o Senhor tendo um conhecimento correto de sua Palavra, mas nem sempre conhecimento teológico é sinônimo de piedade e amor ao Senhor.

Fujamos, portanto, do farisaísmo procurando conhecer profundamente as Escrituras, mas com a finalidade de amar e honrar, pela sua prática, o Salvador.

Milton Jr.


[1] John Blanchard. Pérolas para a vida. São Paulo: Vida Nova, 1993.

18 de julho de 2011

Uma cosmovisão cristã

Cosmovisão é uma palavra que se refere ao entendimento que temos de Deus, de nós e do mundo. Em outras palavras, é a resposta à pergunta de como interpretamos e explicamos tudo o que existe. Abaixo está minha proposta de oferecer de modo sistemático a declaração de uma cosmovisão Reformada, ou seja, um resumo de como entendo e como interpreto o mundo a partir de uma perspectiva calvinista, os acontecimentos e como a vida está sob o governo e relacionada com o soberano Deus, e como todos os valores se organizam à partir dEle.

1. Creio que Deus é um Ser em três Pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. O nosso Deus é infinito, eterno, perfeito e imutável em seu Ser. Em tudo o que faz manifesta a sua bondade, conhecimento, sabedoria, poder, e a justiça segundo o seu soberano propósito. Ele é o criador de tudo o que existe, pela Palavra do seu poder. Em tudo e todos realiza a sua sábia providência, de modo que, não existe acaso, nem fatalismo nos acontecimentos que vivenciamos, mas o absoluto controle em cada situação é a manifestação de sua perfeita vontade. Tudo o que Ele realiza é reflexo daquilo que Ele é. As nossas vidas e nossas famílias estão seguras em suas misericordiosas mãos.

2. Creio que o nosso Deus é pessoal. Ele se revelou através de homens escolhidos, de eventos em diversos momentos e do seu Filho, e tudo que é proveitoso para desvendar o Seu Ser e a Sua vontade, Ele inspirou de modo escrito, para evitar a corrupção e o engano. A sua Palavra Ele a fez registra-la progressivamente para que se tornasse o livro de mediação e revelação das Suas obras e do Seu propósito conosco. Hoje, Deus fala proposicionalmente conosco somente na Sua inspirada Palavra, pois, cessou a revelação dada verbalmente de modo progressivo. Por isso, submetemo-nos somente à autoridade da Escritura Sagrada como sendo a única fonte e regra de fé e prática. Somente ela é a inerrante, clara e suficiente Palavra de Deus. Em sua Palavra, Ele explica como surgiu o universo, quem somos, qual o propósito da nossa vida, bem como a finalidade de toda a existência que é glorificá-lo e desfrutar dos benefícios da sua comunhão.

3. Creio que o ser humano foi criado à imagem de Deus. Deus criou a humanidade: homem e mulher, e ambos de igual modo refletem os atributos que Deus lhes comunicou e, também representam o Senhor como administradores responsáveis de preservar e usufruir da criação. Tanto o homem como a mulher, são iguais em capacidade e responsabilidades; mas o homem deve exercer a sua autoridade como cabeça sobre a mulher, e esta liderança masculina deve ser sem opressão, nem omissão, pois, embora tendo diferentes papéis, exercem funções complementares. O casamento, união entre um homem e uma mulher, é projeto de Deus. A família é um valor que devemos nutrir e defender.

4. Creio que Deus fez uma Aliança de vida com Adão. Como o nosso primeiro pai ele foi o nosso representante nesta Aliança. Todavia, ao ser tentado Adão violou este pacto ao desobedecer o claro comando de Deus, perdendo a comunhão espiritual e todos os benefícios dela procedente. Toda criação que era “muito boa” tornou-se corrompida em seu sistema ecológico. Sobre toda a humanidade foi creditada esta maldição, o pecado é a herança natural que todos recebem de Adão. Por causa deste mal moral todos perderam a santidade, a justiça e o conhecimento perfeito de Deus. Por causa do pecado há inimizade, perda de significado e por fim a vergonhosa morte. Embora corrompidos, ainda somos portadores da imagem de Deus.

5. Creio que Satanás e seus demônios, agentes do mal, conspiram contra tudo o que procede de Deus. Ele tentou os nossos primeiros pais, e os induziu a rebelião contra Deus, e nos confronta tentando seduzir-nos, despertando a nossa cobiça e aguçando o nosso orgulho. Ele é soberbo, assassino, acusador, e inimigo de Deus. Satanás não é co-igual a Deus, pelo contrário, ele é uma criatura submissa ao controle soberano do Senhor. O nosso acusador está condenado, e haverá de ser banido ao sofrimento eterno sob a justa ira no Juízo de Deus.

6. Creio que o mal é tão real quanto indesejável o sofrimento por ele produzido em toda a criação. Entretanto, o mal físico é parte da conseqüente maldição do pecado herdado dos nossos primeiros pais. O pecado gera desordem e destruição no indivíduo e sociedade. Todavia, não acreditamos que Deus seja mero espectador da presença do pecado na história da humanidade, mas de modo misterioso participante de tudo, sem ser o culpado, e sem anular a responsabilidade do pecador. Cremos que todas as coisas, em especial aquelas que parecem escombros depois da destruição do pecado, são matéria-prima que Deus está usando para transformar a nossa vida, conforme à imagem de Cristo, em seu louvor e glória.

7. Creio que o nascimento de Jesus Cristo teve o propósito de reconciliar pecadores escolhidos com o santo Deus. Sendo o Filho de Deus uma Pessoa que subsiste em duas naturezas, divina e humana, é o completo e final revelador entre Deus e os homens. O sofrimento, obediência, morte e ressurreição de Cristo obtiveram a justiça necessária para merecer-nos a aceitação de Deus, bem como a suficiente satisfação da sua ira, realizando a anulação da condenação pelos nossos pecados. Somos perdoados pela justiça e amor de Cristo Jesus, o nosso mediador. Ele eficazmente intercederá por nós até a Sua segunda vinda. A obra de Cristo é o fundamento para a renovação de toda a criação pela presença espiritual e transformadora do Seu reino, que foi inaugurado.

8. Creio que o Espírito Santo inicia a obra da salvação em nós, regenerando e concedendo-nos entendimento espiritual para crermos em Cristo como o nosso salvador. Recebemos no poder do Espírito, e pela aplicação da Palavra de Deus em nós, o dom da fé salvadora e arrependimento necessário para a nossa conversão. Em Cristo a justificação é declarada e creditada a nós. Através da adoção somos feitos participantes da família de Deus. A santificação estimulada pelo Espírito e, exercida em nossos pensamentos, emoções e ações confirmam a nossa eleição e filiação divina. Somos preservados em graça, pelo poder de Deus, para sermos continuamente salvos até o fim. Deus tem uma graciosa Aliança da graça conosco e os nossos filhos, tendo o Senhor Jesus como o nosso único mediador.

9. Creio que o Espírito Santo está presente em nós num relacionamento pactual conosco, habitados por Ele somos batizados no Corpo de Cristo. Ele continua a pairar acima do caos causado pelo pecado, todavia, sem estar alienado ao mal que há no mundo, mas convence-nos da justiça e do juízo, e concede forma à nova criação e fazendo-nos novas criaturas pela regeneração. O Espírito nos une como Igreja, capacitando-nos com dons para o serviço e edificação pela prática da comunhão mútua. Ele testemunha internamente, pela iluminação da Palavra de Deus e, em tudo glorifica a Cristo.

10. Creio que a Igreja é responsável de ser testemunha da verdade e do amor de Deus neste mundo afetado pelo pecado. Somos o povo escolhido para proclamarmos a mensagem de reconciliação e perdão, convidando pecadores ao arrependimento, para confiarem na suficiência de Cristo para a sua salvação. Temos o compromisso de ouvir, viver e ensinar a Palavra de Deus. A salvação não é somente da nossa alma, mas da nossa mente, cultura e sociedade, apresentando o evangelho integral para o homem em todas as suas necessidades. Cuidamos uns dos outros no amor de Deus, vivendo uma comunhão de reciprocidade, cumplicidade e compromisso proporcionando um ambiente de fraternidade e santidade. A Igreja visível é a comunhão daqueles que professam Cristo como o Senhor, reunidos para a celebração, a adoração, a comunhão, edificação e serviço. Buscamos intimidade com Deus através da Palavra, oração e dos sacramentos e, confirmamos a nova Aliança com Deus simbolizada pelo do batismo e Ceia do Senhor. A imagem de Deus é vivida na mutualidade dos relacionamentos.

11. Creio que este mundo experimenta a deterioração dos valores que Deus estabeleceu para preservá-lo. A falta de sentido e propósito também produz a desesperança. A sociedade busca a redenção na tecnologia, cultura, e no sexo, todavia, estes meios são ineficazes de transformá-la construtivamente, pois várias formas de idolatria é fabricada pela cultura pós-moderna. Todavia, cremos que somente com os valores do reino de Deus, num discipulado integral, em que os cristãos se envolvem produtivamente em todas as áreas da vida, podemos participar dum processo de transformação cultural, político, econômico e científico reconhecendo Cristo como o Senhor em todas as esferas da nossa existência. A sociedade inclina-se a não reconhecer a verdade como absoluta, ridicularizando a concepção e a ação de Deus no mundo. Estamos chegando ao fim da história humana não em direção ao desespero e caos, mas a consumação do propósito eterno de Deus. Cristo Jesus julgará toda a humanidade de todas as épocas e culturas, a uns dará a salvação segundo a sua misericórdia, e a outros segundo a sua justiça concederá a merecida condenação dos seus pecados.

12. Creio que o nosso mundo pertence a Deus. Apesar de toda miséria e dor, todas as coisas estão sob o Seu absoluto controle. A nossa esperança de uma nova terra não está presa ao que os homens podem fazer, porque cremos que após o dia do Juízo, todo desafio ao governo de Deus, e toda resistência a sua vontade será anulada, o seu reino, que é inaugurado entre nós, se manifestará em sua plenitude, e o nosso Senhor Jesus governará para sempre com o seu povo. Assim “Deus enxugará dos olhos toda lágrima”, Ele abolirá as nossas enfermidades, findará os nossos conflitos, e implantará a Sua perfeita justiça sobre a terra.

P.S.* Obviamente que nestes 12 parágrafos, é possível que nem todos os demais membros deste blog concordem em todas as declarações, podendo haver variações pormenores de opinião.

14 de julho de 2011

O MAIOR DE TODOS OS MILAGRES!

Em 2006 o Brasil foi surpreendido pela morte do ator e diretor de cinema Jece Valadão, muito conhecido pelos papéis que fazia, interpretando personagens que tipificavam a malandragem e a cafajestagem brasileira. Porém, ultimamente, este artista ficou conhecido como um que havia se convertido ao Evangelho, tornando-se pastor da Igreja Evangélica Assembleia de Deus.

Sua vida pregressa experimentara na vida real o caráter das suas personagens da ficção: seis casamentos, vida boêmia, machismo, vícios etc. Mas com a conversão aos 65 anos passou a afirmar sobre uma nova vida com Cristo e comprometimento com o Evangelho. Não sei nada sobre sua vida na igreja, nem conheço o seu ministério pastoral, mas houve uma cena na produção que ele mesmo denominou: “O Evangelho segundo Jece Valadão” que muito me chamou a atenção. Foi no momento em que ele leu os “10 Mandamentos do Cafajeste”. Percebia-se o constrangimento e a forma insossa com que leu cada item como, por exemplo, “cobiçar a mulher do próximo”, “espancar a mulher-amante”, “tratar bem uma criança hoje porque no futuro se tornaria uma mulher desejável” etc. Ao terminar a lamentável leitura sussurrou com ar de sofrimento: “Eu jamais faria isso de novo!”.

Naquele momento pensei no poder transformador do Evangelho fazendo com que um depravado entregue a si mesmo ao pecado passe a constranger-se e a enojar-se diante da depravação humana. Como já afirmei, não posso avaliar até que ponto houve, realmente, conversão naquele coração, somente a eternidade irá revelar, mas pude novamente avaliar o que o Evangelho fez comigo mesmo (este eu conheço muito bem). Continuo pecador, mas a habitação do Espírito Santo trabalha pela minha santificação, a santificação dos eleitos conforme Paulo nos ensina em suas epístolas.

Esta foi a lição que ficou em minha mente: o grande amor de Deus em transformar com poder um miserável e perdido pecador. Somente pelo poder do céu a minha moral passou a ser balizada pela Santa Lei. Isso é um milagre poderoso!

Espero de coração encontrar o Jece Valadão na eternidade como um remido pelo sangue do Cordeiro, comprovar a misericórdia de Deus em nossa vida e experimentar a sua fidelidade e o seu grande amor pelos séculos dos séculos. AMÉM!

Sola Scriptura

7 de julho de 2011

Olhe-se no Espelho e Encontre a Resposta


Pode parecer estranho, mas acho que não precisamos procurar muito para encontrarmos nosso pior inimigo. Via de regra o crente joga essa alcunha para Satanás, como se ele, sozinho, pudesse fazer alguma coisa concreta contra nós, além de urdir seus planos e ‘tentar’ nos devorar.

Outra tendência do nosso coração é eleger as circunstâncias como nossa grande vilã. Note que não é incomum nos nossos arraiais vermos pessoas justificando pecados atrás de família, criação, ambiente e essa lista poderia ser interminável.

Mas o que a Bíblia diz? Quem é o nosso inimigo mais próximo, perigoso e cruel? Com quem devemos ter mais cuidado na nossa luta incessante contra o pecado, já que sem a santificação ninguém verá o Senhor?

Achei que nunca fosse dizer isso tendo um bom significado, mas aqui vai: olhe-se no espelho e encontre a resposta[1].

Quando Paulo escreve aos Gálatas e nos manda andar no Espírito, afirma: Porque a carne milita contra o Espírito e o Espírito contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que porventura seja do vosso querer (Gl. 5:17). Não fazer o que se quer não é algo fácil, por isso a grande luta do mesmo Paulo em Romanos 7.

Tiago, quando fala sobre tentação, não aponta para a figura do conhecido Tentador, mas ao falar da origem do pecado, declara que cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando essa o atrai e o seduz. Note que a coabitação entre a minha cobiça e eu mesmo faz com que eu gere um filho que tem duas vezes o meu DNA e isso é algo que preciso me desvencilhar, pois é o que me matará; então a cobiça, depois de haver concebido, dá a luz o pecado, e o pecado, uma vez consumado, gera a morte (Tiago 1:14,15).

Pedro também trata do assunto ao ordenar que não devemos nos entregar às nossas próprias paixões, como fazíamos antes e na continuação desse argumento, ele nos exorta, como peregrinos e forasteiros, que nos abstenhamos das paixões carnais que fazem guerra contra a alma.

Não é fácil. Mas os Apóstolos acima aprenderam essa lição com o próprio Mestre. Eles foram convocados negarem-se a si mesmos, e instruídos a entrar pela porta estreita.

Você não consegue deixar o pecado e está procurando o culpado? Enquanto muitos falsos mestres tentarão achar um álibe para a o seu pecado, deixe-me conduzi-lo ao espelho para que você veja, cara a cara, quem é o verdadeiro problema, e se quiser reclamar de alguma coisa, aprenda com Jeremias: Queixe-se cada um dos seus próprios pecados (Lamentações 3:39).

Pelo Reino e com amor,

Samuel Vitalino


[1] Não são batidos os textos que falam da corrupção do nosso coração, mas como já são tão conhecidos, trarei alguns outros que se somam a Jeremias 17:9, Provérbios 6:14; 12:20 e outros.

5 de julho de 2011

As palavras de Jesus são mais importantes que as de Paulo?

questionAqueles que não repararam que a pergunta é uma pegadinha já devem ter pensado: “Que pergunta mais óbvia é esta? Não há como comparar Paulo com Jesus...”.

Pensando somente na resposta, eu concordaria de imediato, afinal de contas o Senhor Jesus é perfeito e não pecou, enquanto Paulo é pecador como nós e, para usar suas próprias palavras, o principal dos pecadores (1Tm 1.15). Porém, a pergunta não se refere a Jesus e Paulo, mas àquilo que falou Jesus em comparação ao que falou Paulo.

Explico: não é de hoje que vejo cristãos afirmando ser aquilo que saiu dos lábios de Jesus mais importante que os ensinos do apóstolo. Com a publicação de uma versão da Bíblia em que as palavras de Jesus vinham destacadas em vermelho, o problema só aumentou. Em discussões doutrinárias o argumento de muitos passou a ser: “Esses versículos são mais importantes, pois aqui foi o próprio Senhor quem falou e não Paulo, Pedro ou algum outro.”

Recentemente uma irmã questionou o post escrito pelo Alfredo, que tratava da submissão da esposa ao marido, argumentando que o único a falar dessa submissão era Paulo, que Jesus nunca havia mencionado uma palavra sequer sobre esse assunto e que, como cristã, seguiria a Jesus e não ao apóstolo.

Aqueles que entendem dessa forma estão diante de um grande problema e caíram numa armadilha da qual nem se deram conta. O problema é o fato de não termos na Bíblia uma linha sequer escrita pelo próprio Senhor. O que temos são discursos atribuídos a ele, mas escritos pelos evangelistas, portanto não seria o caso de crer no que Jesus falou “em oposição” ao que falou Paulo, mas no que os evangelistas escreveram “em oposição” ao que escreveu Paulo, e aqui está a armadilha.

Uma alegação daqueles que estão na armadilha seria a de que os evangelistas andaram com Jesus e aprenderam com ele, enquanto Paulo foi um apóstolo que não teve contato com o Senhor. Eu perguntaria então como sabemos que os evangelistas andaram com Jesus e a resposta óbvia seria que eles mencionam isso em seus escritos. Se é assim, temos a mesma alegação nos escritos de Paulo que afirma: “Faço-vos, porém, saber, irmãos, que o evangelho por mim anunciado não é segundo o homem, porque não o recebi, nem o aprendi de homem algum, mas mediante revelação de Jesus Cristo” (Gl 1.11-12).

Quem entende que Jesus disse coisas opostas ao que disse Paulo tem então um grande problema a resolver, a saber, provar que Jesus, de fato, disse o que os evangelistas afirmam que ele disse.

O que está por detrás desse pensamento falacioso é um conceito errado sobre a Bíblia, é não entender que o Senhor é o autor primário das Escrituras sendo ela, então, “inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda a boa obra” (1Tm 3.16-17).

Outro conceito errado decorre desse primeiro. Quando se aceita a inspiração, a autoridade da Palavra é do próprio Deus, mas negando-se isso a autoridade passa a ser de quem lê. Assim, o leitor aceita o que está em acordo com o seu pensamento e rejeita o que acha errado. É impossível não citar aqui as palavras de Agostinho que certa vez afirmou que “se, no Evangelho, você crê no que quer e rejeita o que não quer, não crê no Evangelho, mas em si mesmo”.

Quando se crê que Deus é autor primário das Escrituras, sendo os escritores apenas instrumentos para registrar a sua vontade de forma infalível (2Pe 1.20-21), como é o meu caso, não se tem o problema relatado acima. Posso crer que as palavras atribuídas a Jesus pelos evangelistas foram mesmo ditas por ele, bem como crer que as palavras proferidas por Paulo foram também aprendidas de Cristo.

Com esta convicção, leiamos toda a Bíblia na certeza de que o nosso Senhor fala em cada uma de suas páginas e, como servos, submetamo-nos de coração às suas ordenanças, acatando todo o desígnio de Deus.

Milton Jr.